Ouvindo o Bolero de Ravel neste amanhecer de domingo e também o último dia do ano de 2023, a única emoção que me domina é sem qualquer dúvida, o de me sentir encantada com tudo que a vida me proporcionou, não apenas nesta ano que ora se finda, mas no conjunto de muitos e muitos anos, nos quais, fui traçando o meu destino ao lado de pessoas, coisas e lugares, verdadeiras preciosidades, e ai, de cada qual, a seu tempo, fui absorvendo texturas , aromas e sabores, estruturando em mim, a bendita oportunidade de poder escolher o que melhor me conviesse.
Foram tantas as oferendas que em muitas ocasiões, confundi-me, acreditando ser o melhor que eu pudesse alcançar, ficando tão envolvida emocionalmente, já que notoriamente sempre fui passional, numa exigência absurda em relação ao autenticamente melhor, fidelizada à forte tendência a teatralidade, pois, ainda criança, senti-me artista, transformando cada amanhecer em cortinas que se abriam, expondo o mais belo palco, onde fui representando no dia a dia, um novo script sempre improvisado.
Textos prontos me enfadavam, uma vez que não me convenciam, assim como suas repetitividades me pareciam medíocres, pois, soavam falso, não se encaixando na minha forma espontânea de enxergar e sentir os palcos e as plateias que foram se sucedendo em minha vida.
Fui constatando na labuta das encenações, o quanto, era difícil, quase impossível, representar um texto inédito...
Ainda o é...
Todavia, eu me sentia visceralmente artista e precisava estar no centro de um palco, declamando como se cada palavra, pincelasse e registrasse no espaço, as inspirações que tinham as minhas mais autênticas cores, que de algum lugar surgiam, mesmo que meus olhos não vissem e minhas mãos não tocassem, mesmo que parte da plateia por não compreender, não aplaudisse.
Hoje, as toco, com a sensibilidade de uma apenas, artista, que nasce, morre e renasce em cada texto declamado, estimulada pelos aplausos de parte da plateia, nas benditas sessões dos meus amanheceres...
As formas, as texturas, as cores e os sabores, são privilégios reservados a todo aquele, que não teme sua capacidade de improvisação, se apresentando em performances autenticas, sempre sorridente e grato pelos aplausos que recebe...
Afinal, compreendi que a qualidade da representação do texto é só minha como artista, cabendo a plateia compreender, aplaudir ou não.
Simples assim...
Regina Carvalho-31.12.2023- Itaparica
Nenhum comentário:
Postar um comentário