segunda-feira, 6 de novembro de 2023

FIEL AMIGUINHA...

Amanheço e penso que sou uma ingrata, afinal, dentre tantos escritos, nunca lembro de escrever, descrevendo as delícias que recebo nos meus amanheceres através de uma fiel companheirona que me aguarda silenciosa na bancada da cozinha, só para me dar bom dia e em seguida, se esconde e por mais que eu a procure, jamais consegui voltar a vê-la, restando-me esperar até o próximo amanhecer.

Como nunca respondeu as minha insistentes perguntas a respeito de sua vida, de onde vem, pra onde vai, se é menina ou menino, se mora só ou tem família, simples especulações tipicamente, humanas, enfim decidi batiza-la de “ Olá”, já que é assim, que a cumprimento.


Olá, em certa manhã esbarrou em mim e assustada, pulei, gritando como uma louca desesperada e a assustei, depois, disso ambas adquirimos o hábito de nos prevenir e ainda mais de nos familiarizar com nossas diferenças, que começam pelo tamanho e principalmente, pela sensação que nossas peles provocam uma na outra.

Jesus, minha quentura deve tê-la queimado, como quando encostamos nossos dedos numa panela quente e ela em mim, causou mais que medo, um enorme espanto, já que seu contato, absolutamente gelado, mais que incomodar-me, provocou espanto e como sou notoriamente uma escandalosa, sabem como é...

Depois, deste primeiro encontro no mínimo sui generis, ficamos espertas e nos resguardamos de novos episódios da mesma natureza, dizemos bom dia, nos exibimos e até, como neste amanhecer, sem muita pressa, ela parou e ficou e olhando, enquanto, preparava o meu sagrado cafezinho e com ela, conversava, tentando quem sabe, dela receber um palpite em relação a minha dúvida, quanto a ir ou não a praia.

Ela ouviu-me pacientemente e em seguida, foi-se, não sem antes vibratoriamente, deixar-me com mais uma dúvida, afinal; porque complico tanto, o simples fato de ir à praia?

Agora, escrevendo, entendo finalmente que complico esta e outras simples e comuns atividades, única e exclusivamente, porque sou preguiçosa e só ando no tranco, precisando sempre de uma motivação e ainda assim, sem muito entusiasmo.

Será?

Como sentir preguiça em encontrar com um amor que tantos prazeres tem me proporcionado nos últimos 22 anos?

Impossível, acreditar que a preguiça seja a razão das minhas dúvidas, provavelmente, o mais correto seria atribuir a imensa falta da companhia de meu Roberto, afinal, a praia era pra nós, um parquinho, onde esquecíamos de nossas cronologias avançadas e pintávamos o sete, sem qualquer constrangimento, também aproveitávamos o isolamento dos amanheceres para deixar as águas mornas nos relaxarem, transmutando nossas mentes para o infinito de nós mesmos, num silencio bendito.

Lembro de algo que ele me falou, quando ainda era meu namorado e silenciosos e sentados num banco enorme, que existia no quintal do prédio da Barão da Torre:

“ Adoro o silêncio que você me proporciona”

Na ocasião com apenas 16 anos, confesso que não compreendi, mas não demorou muito, depois de ler as maravilhas que ele trazia pra mim, entre eles, Neruda, Rilke, Drummond, que, depois, de um dia alucinante de trabalho, a minha presença silenciosamente amorosa, o fazia relaxar para em seguida, me amar alucinadamente.

Ah!..  fui pensando e como sempre viajando nas lembranças e esqueci de dizer que minha fiel amiguinha matinal é simplesmente, uma adorável perereca.

Olá é o nome que lhe dei...

Regina Carvalho-6/11/2023- Itaparica.

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