Pelas bandas do sul, o dia amanhece mais tarde e aí, sinto-me em plena madrugada com o meu entorno ainda dormindo enquanto, aparentemente sozinha, deixo minha mente deslizar no tempo e no espaço como uma astronauta universal de sonhos e realidades, num só encantamento ao constatar sistematicamente que tudo é o que é e que por mais que tentemos modificar, apenas é, seja lá o que for.
Passei minha vida tentando provar por A mais B que fui resultado de uma existência e, no entanto, hoje ou há muito, sem mesmo querer dar o braço a torcer que na realidade, jamais consegui fugir de minha essência e que esta, foi determinante para cada opção que fiz em minha vida, inclusive, aquelas com as quais dei com os burros n’água.
Meu Deus!!!
Como somos arrogantes ao pensar que somos os tais e que detemos alguma maior sabedoria, se somos incapazes de identificar a nossa própria essência, para fazer dela nosso escudo de proteção, e nosso caminho de realizações...
Quantas voltas precisamos dar em torno de nós mesmos para quem sabe, como eu, poder mensurar, nem que seja um pouquinho o que se é?
Por quê?
Porque precisamos estar por todo o tempo num negativismo existencial, fazendo de infinitos segundos, infernos em nossas vidas, contrariando o que é em função de um querer ser sem identificação de originalidade e aí, gente como eu, que mesmo renegando o óbvio e se enveredando por caminhos estranhos a sua própria essência, se sente em algum momento da vida, apenas querendo entender, por que não foi ser o que se era?
Em meio a este raciocínio um tanto esdrúxulo as quatro e meia da matina, depois de um longo feriado, cá estou analisando a força que as circunstâncias do meu existencialismo exerceu sobre a minha essência, empurrando-me, seduzindo-me, induzindo-me por todo o tempo a ser exatamente o que eu não era.
E nesta batalha que não foi e não é só minha, peregrinamos como folhas soltas ao vento, sendo levados nem sempre por brisas leves ao um ser “qualquer coisa” que brilha e seduz, e que simplesmente, não representa a nossa essência, aquela que nos tornaria plenos se a tivéssemos simplesmente aceitado.
Penso então, que eu sempre fui uma abusada e louca criatura que de peito aberto, mesmo inúmeras vezes abestalhadamente, jogou-se às emoções de seus próprios sentimentos e que com eles, não contrariou o que lhe parecia ser, apenas, o que era e nada mais.
Regininha da roça, dos campos e dos riachos.
Regininha do céu em seu casulo de amparo, tendo como companhia as estrelas e os astros.
Regininha da terra úmida, firme, cheirosa e farta, atraindo os pássaros para ciscar-lhe vida.
Regininha dos campos livres, da relva fresca, da água sempre corrente...
Regininha que sempre foi o que é, apenas uma mulher...
Texto do livro " O que eu ainda não contei"- Regina Carvalho-2021
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