terça-feira, 23 de janeiro de 2024

MINHA ITAPARICA

A previsão é de chuva para o dia de hoje, seria bem-vinda, afim de refrescar corpos, mentes e jardins...

Olho através da janela e vejo o céu acinzentado e sinto uma pontinha de receio, afinal, rogo a Deus que se ela vier, que venha sem tantos arroubos, um pouco mais suavizada, afinal, andou fazendo muitos estragos por onde passou...

Os pássaros continuam agitadíssimos, desde ainda bem cedinho, levando-me a pensar, que de repente, toda esta algazarra não seja apenas, seus ais de prazeres, mas uma certa agitação, tal qual, se encontra o meu coração que inquieto, só emite sons à minha mente...


Não grita, não fica nervoso, como acontecia em tempos passados, mas murmura e as vezes, soluça, por minha Itaparica, que a cada dia, é violada no mais profundo da sua essência...

Ainda me lembro e não faz assim tanto tempo que a paz, os sorrisos e a ingenuidade deste povo, me conquistaram, fazendo-me arriar a bagagem de viajante errante e por aqui, ficar, acreditando ter encontrado meu nirvana dos, até então, apenas devaneios de uma apenas escrevinhadora. Dia após dia, fui constatando ser tudo e todos reais e verdadeiros...

Em minha Itaparica curei-me física e emocionalmente, resgatando dos recôncavos de mim, o tudo de bom, assim, como voltar a ser apenas, a dona Regina sorridente, mansa e apaixonada pelo belo, o justo e o nobre, sem medo de ser feliz. 

Expressei a cada instante, a certeza de minha felicidade, fosse banhando-me nas águas mornas e mansas de Ponta de Areia, fosse sentada na varanda de casa com meu Roberto, nos finais das tardes mornas, esperando a noite chegar, salpicando o céu de estrelas cintilantes, fosse abraçando e sendo acolhida por pessoas amigáveis e solidárias, na beleza suprema de suas simplicidades, fosse com o microfone na mão, por sobre um trio Elétrico, exercitando a minha cidadania ou nos estúdios da Rádio Tupinambá, fosse diante do computador registrando minha alma, fosse caminhando sem medo pelos calçadões a beira mar...

Vivi e saboreei sem constrangimentos hipócritas ou absolutistas, o tudo de bom que minha Itaparica tinha para oferecer, talvez, por esta razão, meu coração já há algum tempo, chora por uma paz que a vaidade desmedida destruiu sem qualquer piedade.

Pintaram os meios fios e calçadas, ornaram a cidade com pracinhas e balanços, camuflaram a miséria que se agigantava com bandas musicais, transfiguraram o originalmente belo, tirando de cada, a preciosa personalidade e calçaram com o falso progresso, a falta da bendita liberdade.

Liberdade que me foi oferecida e com a qual, respeitosamente revesti minha vida. 

Talvez, por isso, minha mente ricamente abastecida de um tudo de bom, seja ainda capaz de sensível, ouvir o bater agitado das asas dos pássaros, reconhecendo nos seus doloridos cantos, o também lamento pela estupidez humana, que a tudo destrói, inclusive e principalmente a ele, com a arrogância da própria ignorância, numa incessante e gananciosa corrida, atrás de uns trocados a mais...

OBS: "Nirvana é uma palavra do contexto do budismo, que significa o estado de libertação atingido pelo ser humano ao percorrer sua busca espiritual. O termo tem origem no sânscrito, podendo ser traduzido por "extinção" no sentido de “cessação do sofrimento”.

Regina Carvalho- 23.01. 2024- Itaparica

Foto: Wikimedia Commons

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