A tarde lá vem chegando sem pressa e eu, no mesmo ritmo a ela me entrego, deixando o corpo relaxado e os dedos flexíveis, afim de que possam seguir o compasso de minha mente que ao contrário da tarde, tem pressa...
Pressa para escrever, forma bendita de pedir socorro pelo melhor de mim, afim de proteger o que sobrou das muitas queimadas que precisei atravessar nesta vida, abrindo mão de quase tudo, apenas para salvar a minha autenticidade que como uma nuvem suave, a tantos sempre ameaçou sem que eu pudesse entender as razões.
Passei a vida sem compreender por que viam nela uma sempre tempestade eminente, quando, amorosa, só queria oferecer uma agradável sombra, onde a rudeza ardilosa da mentira e do engodo, não encontrasse espaço para fazer morada.
Aos 20 anos, supliquei que não destruíssem o meu direito de sonhar e aos trancos e barrancos, sonhei e sonho até hoje...
Aos 40 anos, implorei e de tudo me despojei pela paz que eu sabia existir e estar a minha espera e em busca dela, parti...
Aos 50 anos, finalmente a encontrei, fazendo dela, uma manta aquecida, assim, como um mar sereno de águas mornas...
Sou como um velho coqueiro que encontrou a sua praia em meio ao abrasador sol, sem nenhuma outra pretensão, além de sentir o farfalhar das folhas, bailando e produzindo as brisas da serenidade.
Aos setenta, este sistema macabro, ainda espera que eu desista do melhor de mim...
Não posso e então, chicoteiam-me como uma escrava rebelde, talvez, esperando que eu sucumba à dor e deixe rolar na bandeja dourada da sordidez e da hipocrisia o melhor de mim...
Por que o melhor de mim incomoda tanto?
Como explicar que desconheço como ser o que esperam de mim?
Estou cansada de tentar esconder o que já nasceu tatuado em mim...
Regina Carvalho.15.03.2024 Itaparica
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