terça-feira, 23 de setembro de 2025

Sucesso Insustentável

O frio regressou ontem à tarde e hoje permanece, ainda que de forma incerta. Busquei então refúgio nas vibrações musicais de Tchaikovsky, compositor russo intimamente associado a célebres balés como O Lago dos Cisnes e O Quebra-Nozes. A música transportou-me para palcos de uma beleza sublime, expressão maior da capacidade criativa do ser humano. Por alguns instantes, consegui esquecer a sucessão de inutilidades que se apresentam na cena social, marcada por atos ilícitos públicos que, mais do que incomodar, adoecem e destroem uma parcela significativa da sociedade brasileira, muitas vezes sem plena consciência das suas consequências imediatas e colaterais.


Olho ao redor e questiono: até onde iremos com este contínuo espetáculo de engodo? Afinal, nada parece sólido, real ou minimamente seguro. Como confiar se máscaras disfarçam uma rotina de hipocrisias? Em que narrativas enterram a espontaneidade, o lícito, o justo e o nobre?

É então que me imagino a rodopiar no centro de um palco, com a leveza de um cisne. Finjo ser o que nunca serei, apenas para escapar ludicamente de uma realidade cruel. Nesse movimento, a arte surge como defesa contra a loucura, sem ter de utilizar uma farmacologia que, ao mesmo tempo que adormece os desesperos, mina o mais precioso da natureza humana: a capacidade de discernir entre o belo e o feio, o agradável e o insuportável, o íntegro e o apenas colado.

Na longa caminhada, percebo-me ainda inteira, embora assustada. Graças à música, à literatura e à delicadeza das borboletas, encontro apoio no lúdico, expressão viva e palpitante da diversidade grandiosa da vida. Nessa resistência, reconheço o valor dos gênios que souberam retratar tais belezas com a sensibilidade das suas almas. Diante deles, torna-se ainda mais evidente a brutalidade de um presente em que o inóspito é transfigurado em ideal, num sucesso contínuo da loucura e da infelicidade insustentável.

Regina Carvalho – 23.09.2025, Tubarão SC

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Foto -Theatro Municipal do Rio de Janeiro, O BALLET “O LAGO DOS CISNES” com Ana Botafogo-|Midiorama

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