E assim, vai-se ao pé da letra, levando a vida, crendo que segue propósitos. Mas, na maioria das vezes, criam-se caminhos apenas para justificar a própria existência. Para tal, desenham-se e esculpem-se buscas e conquistas sob os auspícios de modelos pré-determinados de uma cultura repetitiva e, geralmente, atávica.
Cega-se.
Ensurdece-se.
Anestesia-se.
Enquanto isso, a vida vai fenecendo, silenciosa e lentamente, antes mesmo que a finitude os alcance.
E como zumbis, vaga-se. Cada qual em seus castelos, casebres ou calçadas, dentro de um sistema sem alma que desestrutura até aniquilar o que há de mais autêntico e sensível. Maldoso o suficiente para deixar marcas em alguns, permitindo-lhes sentir, de forma consciente e lúcida, a morte antecipada de suas ideias e ideais mais genuínos.
Rouba-se a esperança, a única capaz de mover as barras de aço da prisão invisível que se instala dentro das pessoas.
Em instantes raros de lucidez, é possível catalogar montanhas de ações e reações absurdamente desnecessárias, que impedem o simples viver sentindo-se. Viver como tudo mais vive, tal qual se apresenta.
Como nada de verdade é observado, sentido ou degustado, as ilações e os “achismos” passam a ditar normas de conduta que, em sua esmagadora maioria, são tolas, burras ou inconsequentes.
As soluções oferecidas como bengalas existenciais são muitas e variadas. Contudo, seus efeitos são breves e viciantes.
Que tal traçar como meta para 2026 evitar as inúteis perdas de energias?
Falar menos o que não é necessário.
Discutir menos.
Argumentar menos.
Talvez buscar seletividade nos relacionamentos de qualquer natureza. Arriscar-se ao diferente. Evitar, sempre que possível, a mesmice comportamental.
E então, interromper o vazio apenas para sentir que a vida é muito mais do que o mundinho clonado que o sistema viciado e corrompido insiste em oferecer.
Neste instante, interrompo estes escritos. Pauso apenas para escutar o mundo encantado e regenerador do silêncio, que traz consigo um sabiá cantando lá fora.
Parte deste texto foi escrita em 30.12.2024, na quietude de minha Itaparica. Hoje, considerei adequado revisitá-lo, com alguns ajustes, pois observo uma piora abusiva da alienação em relação à vida, agora, somada a uma crueldade mais explícita, travestida de indiferença brutal, ostentada pelas mídias e ignorada pelo mundo.
Crueldade que, sorrateira e perniciosa, forma-se nos cada vez mais desajustados seios familiares, culminando sob a luz do sol ou das estrelas, nas calçadas, avenidas e ruas de qualquer lugar.
Regina Carvalho
30.12.2025 — Pedras Grandes / SC

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