Cinco horas desta manhã de início de um verão que já promete ser absurdamente quente e amoroso, já que as cigarras alvoraçadas, mal o dia clareia, iniciam o canto do acasalamento.
E eu acompanho, fascinada, os movimentos desta natureza exuberante que me cerca, não me permitindo perder absolutamente nada, já que dependo deles para determinar a qualidade dos meus instantes presentes, que, afinal, é tudo o que realmente importa.
E aí, inevitavelmente, penso que quem me lê possa deduzir que vivi com tempo disponível e sem maiores obrigações, além de apreciar os voos das borboletas e os cantos dos pássaros para, então, escrever poesias.
Tolo engano...
Teria sido perfeita, com certeza, a vida que eu pediria a Deus. E este, para se ver livre do meu insistente assédio, proporcionou-me, dentro do possível, pequenos nichos de paraíso, mesmo que, bem próximo, houvesse o burburinho de alguma cidade.
Pensando cá com meus botões, que culpa me cabe se ele mesmo me esculpiu escrevinhadora, precisando das texturas, cores, aromas e sabores da vida para me sentir plenamente viva e minimamente capaz de descrever a sua bendita criação?
Lembro de Vinicius, Jobim, Chico Buarque, Marcos Valle, pratas do bairro de Ipanema, e tantos outros agregados que cruzavam as calçadas com a Regininha sonhadora, entre a Lagoa e a Praia, despertando nela o desejo de ser igual a eles... Abusada, né?
Penso, então, que se me faltou talento, com certeza não faltaram disciplina e vontade imensa.
Lembro, neste momento, da minha Itaparica e do galo do vizinho, despertando-me a cada amanhecer, enquanto, por estas bandas catarinenses, tenho as cigarras apaixonadas, pelo menos no verão, desejando viver e morrer de tanto amar.
Exatamente como eu...
Regina Carvalho
26.12.2025 – Pedras Grandes / SC
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