quinta-feira, 21 de agosto de 2025

“Entre Estações”

Será que eu deveria ter-me preparado mais, pensando na velhice? Mas afinal, como é que se prepara?

Eu, enquanto jovem, tive tanto em que me ocupar que, sinceramente, não tive tempo de pensar num depois...

Preocupei-me tanto em proteger a mim e aos meus das tempestades dos invernos e dos sóis ardentes dos abrasadores verões, abrigando-me entre galhos e folhas da minha floresta pessoal, arando e semeando os solos férteis que fui encontrando pelo caminho, que jamais pensei no futuro, já que o plantio do aqui e agora, premente, exigia rigorosa dedicação.


Pois é... Sorrateira e silenciosa, como folhas que caem nos outonos, a velhice foi forrando o entorno de mim, árvore que o tempo, independente, fortaleceu, enquanto despetalava a copa, numa mutação repetitiva que preencheu minha existência, enriquecendo o solo à minha volta.

Sem tempo para o depois, centrei-me no agora e, entre o céu brilhantemente translúcido dos insistentes devaneios da poeta e os solos ásperos das duras caminhadas da sobrevivência, segui vida afora, de estação em estação, sorvendo o que me foi possível, doando-me por inteiro e, ainda assim, não me preparei?

Restam-me os pássaros e as borboletas e este bendito sol que, insistente, se mantém em mim, aquecendo a minha alma e consolando a minha mente diante do fato incontestável de que não me preparei... para este aqui e agora, envelhecido, mas ainda tão realisticamente vivo e apaixonado como dantes o fora.

Regina Carvalho – 21.08.2025

Tubarão, S.C.

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