sábado, 24 de julho de 2010

PÃO COM MORTADELA

Ainda no embalo das recordações, vém em minha mente e, consequentemente, em minhas papilas gustativas o sabor da infância e da juventude que, de quebra, ofereceu-me por toda uma vida o sentido amoroso de respeito à qualquer alimento, desde que fosse cuidadosamente preparado, nem sempre, necessariamente, precisava ser doméstico.
O carinho e o cuidado com que minha mãe preparava as merendas dos filhos diariamente foi uma tarefa rotineira que ela conseguiu transformar em inesquecível, justo pela criatividade das junções dos sabores com a atenção afetiva.
Lembro-me, por exemplo, do pão de leite com sardinha, que ela amassava no garfo e misturava com um pouco de maionese caseira, que eu comia e me regalava entre uma dentada e outra, daquele manjar dos Deuses e uns goles apressados de guaraná da antártica, bem geladinho.
Nesse instante, me vejo uma garota de pouco mais de l3 anos, sentada em um dos degraus da arquibancada do Clube de Regatas Flamengo, na Gávea, lá no Rio de Janeiro.
Meu rostinho bronzeado do sol, abrigava um suor sadio e meu peito de atleta juvenil arfava de um suposto cansaço, depois dos muitos exercícios que junto a outros acabara de fazer.
E aí, lá estava o lanchinho preparado pela DONA HILDA, matando a natural fome e mantendo os benditos elos de amor e liberdade.
Penso, então, que o modernismo é sempre bem-vindo, mas os elos fraternos não podem e não devem ser colocados em planos desconsiderativos em favor de nenhum deles.
Falem o que quizerem a repeito de minhas conceituações vivenciais, pois jamais deixarei de admitir que o afastamento dos laços fraternos de pele e atenções genuinamente amorosas, onde etiquetas de supermercado, boutiques ou qualquer outra loja, seja sustituto adequado à qualquer formação emocional harmoniosamente integrada à vida.
Nada, absolutamente nada, seria capaz de me alimentar de forma mais completa que aquela merendinha simplesmente maravilhosa, que completava a cada dia o meu crescer e certamente o de todos quanto tiveram o privilègio do pão com goiabada, presunto ou mortadela, do misto-frio e de tantas outras criatividades afetivas proporcionadas por aquelas mães, que não se importavam em simplesmente serem mães.
Os conceitos, de lá para cá, foram mudando até se tornarem um tremendo MICO levar merenda de casa, assim como se tornou um tremendo Mico uma mulher ser a provedora emocional e, portanto, estrutural da família.
E alguém ainda duvida que toda esta mazela na qual todos nós somos testemunhas oculares diariamente, onde a família vém se destroçando, não está relacionada ao abandono de atenções que as crianças vém sendo expostas nos últimos 40 anos, quando, então, as mulheres decidiram que deveriam ter os mesmos direitos dos homens, esquecendo-se de que ela, por gerar e parir e, portanto, reservar em sí todo o potencial sensitivo, seria insubstituível na estruturação de seus rebentos?
Atiraram-se como aventureiras em loucas jornadas de árduos trabalhos,
e aí, como enxergar a presença da droga nos olhos ofuscados dos filhos?
Como evitar o inevitável, se não houve tempo sequer para compartilhar os instantes cruciais onde o não pode, o não vai, ou o sorriso do tudo bem,,não existiu.
Não me sinto solitária nesta avaliação, afinal, na edição da Veja, de número 2174, é possível constatar-se que hoje 26% das mulheres bem sucedidas, com formação acadêmica privilegiada e salários invejados, estão trocando suas escaladas profissionais pelos seus benditos lares, frente à conscientização que somente elas serão capazes de reverter esta absurda escalada de desamparo existencial que assola toda e qualquer sociedade onde o fraterno foi esquecido ou substituído por atividades ou qualquer tipo de compensação, onde o olhar protetor e orientador não esteja presente na quantidade e qualidade necessária, que também difere à cada indivíduo.
Na vida, não somos capazes, sejamos homens ou mulheres, de termos ou sermos tudo ao mesmo tempo.
A opção em ser mãe é um ministério, que mais do que nunca nos tempos atuais não pode ser comprometido, dividido e tão pouco transferido.
É uma questão de opção, bem mais séria, porque envolve outra vida, bem mais complexo que se optar em ser engenheira ou dentista, balconista ou garçonete.
Portanto, nada contra a mulher profissional, apenas e, tão somente, que ela chupe cana ou assovie, pois ambos são incompatíveis.
Que a realidade que nos afronta mostre vantagens, que a vivência e a experiência ainda não me mostraram.
A praga da solidão existencial se espalha, contaminando sem piedade a todos sem distinção de qualquer natureza, em uma devastação assustadora, soterrando valores estruturais e colocando em seus lugares pseudas verdades, atrativas e convincentes, que, afinal, se fossem assim tão boas, não teriam permitido tamanho descontrole social, revestido em contemporismo ou evolutismo, que de verdade só tem a indução em deixar-se de ser, para tão somente buscar o ter, atropelando ou desconsiderando o outro, porque não reconhecem sequer a sí mesmos, reservando em seus individualismos o entendimento de se sentirem em profunda solidão.
Bendito lar estruturado com figuras determinadas e presentes, cada qual com sua responsabilidade como margens delimitadoras, que ampliavam direitos e orientavam quanto aos deveres.
Bendito pão com mortadela, bendita mãe que eu pude ter.

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