São quatro e trinta desta manhã de primavera atípica, fria, chuvosa, distante das flores, dos pássaros e das borboletas.
Flores… onde estão, que não as encontro senão nas lembranças dos jardins da minha vida?
Percebo que não estou ouvindo minhas habituais músicas. Terá sido intencional, para escutar os tímidos pássaros que, lá fora, tentam lembrar-me de que, apesar de tudo, é primavera?
Enquanto procuro um som que combine com a leve frustração de não poder abrir portas e janelas, dou-me conta de que vivi mais que muitos jamais viverão e, ainda assim, sei tão pouco sobre a vida.
Talvez seja justamente essa consciência da ignorância que me faz querer ir além do óbvio, porque o aparente nunca me bastou.
Mesmo que eu vivesse milénios, jamais desvendaria todas as nuances do que existe ao alcance dos meus sentidos.
Como ousar, então, crer que sei algo, se nem a mim mesma conheço por inteiro?
E, como de hábito, exclamo:
“Jesus, toma conta de mim e desta humanidade que, ao tentar entender tudo, acaba perdida na própria ignorância.”
Agora deixo que as músicas do veneziano Tomaso Giovanni Albinoni (1671–1751) acalmem minha mente e aproximem a primavera de mim.
— Regina Carvalho, 22.10.2025, Tubarão – SC

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