De súbito desperto,
e num gesto leve, quase vento,
elevo o braço ao amanhecer.
Minha mão esquerda dança no ar,
como se o mundo coubesse
entre o abrir e fechar dos meus dedos.
Oh, maravilha que somos…
Basta olhar a nudez simples das mãos
para entender que nelas vive um templo:
força, delicadeza e destino.
E tantas vezes esquecemos
o milagre que carregam.
Enquanto as contemplo, enamorada,
os pássaros, em festa, batem no vidro,
trazendo risos de asas,
avisando madrugadas frias.
E eu, obediente à música do dia,
puxo a colcha com minhas fiéis companheiras.
Novembro declina, mais um ano se despede,
e recordo a vida inteira a passar
pelas pontas dos meus dedos:
folheando livros, escrevendo o mundo,
dedilhando sonhos em teclas,
segurando canetas que me revelaram.
Com essas mãos, acolhi meus filhos,
toquei o homem que amei,
acariciei quem a vida me deu por graça.
Nelas escondi meus medos,
nossos segredos,
e enxuguei lágrimas,
as que doeram e as que brilharam.
Estas mãos vestiram meu corpo,
calçaram minha vaidade,
lavaram a casa onde habito:
eu mesma.
E também cozinhou meu afeto,
transformando amor em cheiro e sabor
para os que guardo no peito.
Com estas mesmas mãos, bati portas,
ergui fronte, firmei voz,
num mundo que me queria pequena
quando minha alma buscava horizontes.
Que amor é esse, meu Deus,
que coube em dois pequenos membros
tão cheios de vida?
Mãos benditas, que agora se juntam
num gesto doce, simples, eterno:
um beijo enviado a você,
alma linda que me lê
e me acompanha nesta noite.
.
(poema inspirado no texto de Regina Carvalho, escrito em 18/11/2021)
Regina Carvalho-18.11.2025 Pedras Grandes S.C

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