São quase cinco horas da manhã e os pássaros ainda não acordaram, ficando a casa e o jardim absolutamente silenciosos, enquanto, minha mente pulula entre as lembranças de tempos vividos, onde a convivência era mais respeitosa, mesmo existindo preconceitos, hipocrisias, intolerâncias, guerras e etc.
Entre um movimento e outro dos violinos agitados que executam uma área clássica de Johann Sebastian Bach, penso que éramos felizes e nem nos dávamos conta...
Lembro que ir à praia era uma oportunidade a mais de encontrar a turma da rua e por lá, jogar conversa fora, afinal, não faltavam assuntos, namorar sem a vigilância acirrada dos pais, paquerar alguma beldade da turma da rua vizinha e quando, a fome ou a sede apertavam, lá estavam os incansáveis vendedores de limonada e dos biscoitos de polvilho e vez por outra, um hippie, surgia com sanduiches naturais que nem sempre arriscávamos comer, afinal, a origem duvidosa ainda era temida.
Os biquinis, já eram comuns, mas bundas e peitos ainda eram preservados, deixando os garotos exercerem as suas imaginações, assim, como as preferências sexuais eram intimidades invioláveis.
Os beijos e as carícias eram prêmios que nós, adolescentes, recebíamos e incorporávamos como balizadores da divina passagem que levava a infância a outro patamar, permitindo que nossos hormônios aflorassem deliciosamente.
Ainda posso lembrar emocionada do frio na barriga quando, Jeff e eu, ambos com quinze anos, nos beijamos apaixonadamente, mesmo temerosos em sermos flagrados pela minha sempre vigilante mãe.
Muita adrenalina, inesquecíveis emoções...
Penso então, como será difícil, senão impossível os jovens atuais, lembrarem-se de seus despertares físicos e emocionais no futuro, se atropelam a infância, anulam a adolescência, enveredando-se num estado adulto, como diria minha mãe, sem eira e nem beira, sem darem tempo ao seu todo pessoal de processar assimilando as preciosas etapas do bendito desenvolvimento físico e emocional humano.
Será estas as razões que transformaram as praias em permissivas exposições de corpos, assim, como um boteco a céu aberto?
Os beijos dantes desfrutados, deixaram de ser saboreados para serem mensurados pelas quantidades conseguidas a cada final de semana e o sexo, dantes revelador e prazeroso, foi substituído pelas “curras” rápidas, sem maiores emoções, até mesmo, nos leitos conjugais.
Os pássaros, finalmente acordaram, levando-me a concluir que a música agitada de Bach, deve tê-los acordado, mas também, já era hora...
Como sempre, sou abusada e de alguma forma extrapolo, enxergando sem meias palavras, uma humanidade que cada dia, desconhece o tesão com emoções amorosas ou recordando-me das lembranças de uma juventude farta de emoções e sensações ou, na pressa em rever os pássaros e seus cantos a cada amanhecer.
Regina Carvalho- 29.4.2025 Itaparica
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