sábado, 22 de fevereiro de 2020

VOCÊ SABIA QUE O SABER NUNCA É DEMAIS?


George Wilhelm Fredrich Hegel
HEGEL, deixou-nos uma monumental obra filosófica, cujos maiores marcos foram, sem dúvida, A Fenomenologia do Espírito (1807), Ciência da Lógica (1816), Princípios da Filosofia do Direito (1832), Lições sobre a História da Filosofia (1836), Lições sobre a Estética (1837-42) e Lições sobre a Filosofia da História (1837). Para uma vida relativamente curta, Hegel nasceu, em 1770, em Estugarda, e morreu, em 1831.
Uma leitura dos discursos sobre educação permite-nos isolar as seguintes linhas de força: os métodos pedagógicos, a questão da disciplina, a formação ética dos jovens, as relações escola e família e a escola como instrumento de transmissão da herança cultural. Procurando dar a palavra a Hegel, sempre que possível, vamos passar em revista aquelas linhas de força.
SOBRE A CULTURA CLÁSSICA
Eis o que ele nos diz a esse respeito: "O progredir da cultura não pode ser visto como a tranquila continuação de uma cadeia em que os elementos seguintes se venham juntar aos anteriores, ainda que tendo-os em consideração, mas a partir da sua própria matéria e sem que este trabalho de prolongamento se dirija contra os primeiros. Antes pelo contrário, a cultura tem de ter uma matéria e um objeto anterior, sobre o qual trabalha, modificando-o e dando-lhe uma nova forma. É necessário que conquistemos o mundo da Antiguidade, tanto para o possuir, como ainda mais para ter algo que nós transformemos" . A este respeito, Hegel chega a afirmar que quem desconhece a cultura clássica, ignora o que é o belo.
SOBRE DISCIPLINA
Um outro eixo fundamental das ideias educacionais do grande mestre da dialética é a questão da disciplina, da ordem e da serenidade na sala de aula e na escola. A este respeito, chega a afirmar, num dos seus discursos, que a haver alguns alunos que não sejam capazes de respeitar as relações de cortesia e as regras da boa conduta, então o reitor deve devolver esses alunos às respectivas famílias, para que elas façam aquilo que às famílias compete fazer, ou seja, fazer respeitar as regras da convivência social.
A formação ética dos alunos é considerada, por Hegel, tão importante como a sua formação intelectual. As metodologias utilizadas para a transmissão dos valores e a formação do carácter incluem, em primeiro lugar, o "tom da escola", ou como hoje chamaríamos, o clima da escola, o hábito de fazer as coisas bem-feitas, o exemplo do professor, a exortação, a reflexão e a leitura das grandes narrativas clássicas. Defensor de uma escola ordeira e serena, porque sem ordem e disciplina não é possível aprender.
A este respeito, convém notar que Hegel é um acérrimo partidário de uma formação integral da pessoa, uma vez que afirma "a formação geral está, segundo a sua forma, ligada, do modo mais íntimo, à formação moral; pois não devemos de modo nenhum limitá-la a alguns princípios e máximas, a uma honradez geral, uma boa intenção e disposição moral honesta, mas antes acreditar que só um homem como uma boa formação geral pode ser também um homem com formação moral" .
ESCOLA E FAMÍLIA
Vejamos, agora, quais eram as ideias de Hegel face às relações da escola com a família. Convém notar que Hegel considerava que à escola competiam funções que a família não podia desempenhar. Esta compete-lhe criar, no aluno, uma boa disposição e atitude para o estudo, o conhecimento e a apreço pelas relações de cortesia, os bons costumes e as regras de conduta. À escola compete a formação intelectual, moral, espiritual e física do aluno, a formação integral, portanto. Apesar da distinção das funções e dos papéis, Hegel considera que é necessário um diálogo e um bom entendimento entre a escola e a família. "Só através de uma ação comum e concordante de pais e professores se pode alcançar um êxito efetivo em casos importantes, particularmente os erros morais. Assim como os pais têm de esperar toda a colaboração, neste campo, por parte dos professores, também estes podem esperar que pais bem-intencionados se comprometam ao mesmo, em casos em que se possa tornar necessário dirigir- sê-lhes e convidá-los a colaborar".
O ENSINO PÚBLICO
Hegel foi, também, um defensor da generalização das escolas públicas. O liceu de Nuremberg, por ele dirigido, era um bom exemplo, para o seu tempo, do papel que o ensino público podia ter na melhoria das condições sociais e culturais da população. A sua preocupação com o apoio social aos alunos mais carenciados é um tema recorrente em quase todos os discursos. Na ausência de uma política estatal de apoio social aos mais necessitados, Hegel foi capaz de mobilizar a população local para que, através de doações e bolsas, fosse possível garantir o ensino aos alunos pobres com capacidade e interesse pelos estudos superiores. "Um outro aspecto de meio externo é o apoio aos alunos do nosso estabelecimento necessitado de meios externos para estudar. As coletas anteriores, que eram organizadas recorrendo ao cantar nas ruas em frente das residências, tinham fundamentalmente este objetivo...A quantos, nascidos de pais sem recursos, foi assim dada a possibilidade de se elevarem acima do seu estatuto social ou de se manterem no mesmo e desenvolverem talentos que a pobreza teria adormecido ou deixado tomar uma má direção!"
Esta preocupação pelo assegurar de um ensino gratuito de qualidade para todos e de uma distribuição justa das bolsas e apoios pelos alunos mais necessitados é uma constante, sobretudo no 3º discurso, proferido em 1810, há exatos 210 anos.
A ESCOLA E A VIDA
"A escola é, portanto, a esfera mediadora que faz passar o homem do círculo familiar para o mundo, das relações naturais do sentimento e da inclinação para o elemento da coisa. Isto é, na escola começa a atividade da criança a receber, no essencial e de forma radical, um significado sério, na medida em que deixa de estar ao critério do arbítrio e do acaso, do prazer e da inclinação do momento; aprende a determinar o seu agir segundo uma finalidade e segundo regras" . "A escola é, portanto, a esfera mediadora que faz passar o homem do círculo familiar para o mundo, das relações naturais do sentimento e da inclinação para o elemento da coisa. Isto é, na escola começa a atividade da criança a receber, no essencial e de forma radical, um significado sério, na medida em que deixa de estar ao critério do arbítrio e do acaso, do prazer e da inclinação do momento; aprende a determinar o seu agir segundo uma finalidade e segundo regras" .
HERANÇA CULTURAL E SEUS CONTEÚDOS
Igualmente estranho ao pensamento educacional do grande mestre alemão, era a ideia da necessária igualdade nos resultados escolares. Para Hegel, a igualdade de oportunidades não podia prescindir do esforço individual, da vontade de aprender, do espírito de sacrifício e do querer ir mais além. Eis as suas palavras: “Os professores, se pensassem só em si, ver-se-iam de boa vontade libertos daqueles cuja falta de atenção e de aplicação, assim com outros comportamentos impróprios, tiveram de combater ao longo de um ano. Mas considerações mais elevadas impõem-lhes o dever de, contra o que lhes seria mais agradável, contra as expectativas dos alunos e em certa medida dos pais, só dar a passagem em consequência do mérito". E, mais adiante: "Não é difícil de ver que é inteiramente para seu próprio proveito que são, de acordo com as suas classificações, mantidos numa classe mais tempo do que poderia acontecer. Pois que o ensino de um nível mais elevado, sem estarem predispostos para ele, sem apresentarem as bases necessárias, seria em grande medida, perdido para eles; em vez de avançarem, atrasar-se-iam antes cada vez mais, quando, pelo contrário, podem, efetivamente, participar nas lições de um nível inferior e através dessa participação, irem progredindo".
Embora Hegel se afastasse das concepções românticas da educação, partilha um optimismo sobre a bondade dos efeitos de uma educação de qualidade: "os tesouros interiores que os pais dão aos filhos, através de uma boa educação e pela utilização de estabelecimentos de ensino, são indestrutíveis, e mantêm o seu valor em todas as circunstâncias; é o melhor e mais seguro bem que podem proporcionar e deixar aos filhos"
As ideias educacionais de Hegel podem considerar-se realistas e avançadas para o seu tempo. Contudo, importa verificar que, no tempo de Hegel, não existia, ainda, uma escola secundária de massas, pelo que, não nos pode parecer estranho, a sua defesa de uma escola secundária exigente e seletiva. Evidentemente, a necessidade de exigência e rigor não deixou de ser pertinente, nos dias de hoje, porque uma boa formação das novas gerações depende da qualidade da educação. Contudo, atualmente, as escolas são confrontadas com exigências e responsabilidades ainda maiores do que no tempo de Hegel. Agora, trata-se de conseguir associar a qualidade da educação a uma educação para todos.
As ideias educacionais de Hegel podem considerar-se realistas e avançadas para o seu tempo. Contudo, importa verificar que, no tempo de Hegel, não existia, ainda, uma escola secundária de massas, pelo que, não nos pode parecer estranho, a sua defesa de uma escola secundária exigente e seletiva. Evidentemente, a necessidade de exigência e rigor não deixou de ser pertinente, nos dias de hoje, porque uma boa formação das novas gerações depende da qualidade da educação. Contudo, atualmente, as escolas são confrontadas com exigências e responsabilidades ainda maiores do que no tempo de Hegel. Agora, trata-se de conseguir associar a qualidade da educação a uma educação para todos.
Resumo de Regina Carvalho do trabalho interpretativo de Ramiro Marques do livro Hegel. Discursos sobre educação (1994), traduzido e adaptado por Ermelinda Fernandes. Lisboa. Edições Colibri

Nota: O mais absurdo é que um número expressivo de professores, sequer ouviram falar deste filósofo, cujos estudos, basicamente são os alicerces culturais e educacionais que serviram de modelos para os demais que o sucederam.

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