Adoro os amanheceres, pois neles me deito no silêncio
recortado pelos grilos e pássaros, pondo-me a fazer o que mais gosto, que é
justo transformar minha mente num rolo de filme, donde posso com meu impulso
voluntário adentrar no imaginário de renovadas criações ou, tão somente,
rebobinar o já registrado em uma busca enriquecedora de um entendimento mais
amplo e mais completo, seja lá do que for que eu tenha testemunhado nos meus
andares cotidianos.
Nesta manhã, meu filme, ao ser rebobinado, mostrou-me fatos e
versões da última semana, levando-me a crer que por mais que eu viva e escreva
sobre minhas experiências pessoais, ainda assim, mais estarei convencida de que
me é impossível traçar modelos fixos das características da complexidade humana
em suas convivências sistêmicas.
Assim como jamais poderei estancar o fluxo caudaloso de
minhas mais volumosas emoções.
O filme se acelera e, de repente, as imagens ficam disformes
e tudo, então, perde o sentido, pois não há figuras definidas e, a partir daí,
nada mais posso sinceramente observar.
Faço parar o filme, aliso meus cabelos, respiro fundo e volto à uma nova
tentativa e me surpreendo, pois algo acontece com minha máquina neurológica
fazendo o filme congelar em uma imagem em uma pequena escrita no centro de uma
tela em branco que dizia:
- “Poder público.”
Esforcei-me muitíssimo para que as imagens se fizessem presentes,
mas tudo que consegui foram sons soltos de argumentos repetitivos, falados por
diferentes autoridades de diversos postos institucionais que me reportaram às
lembranças de outros filmes que, de tão banais, foram arquivados com o
propósito de jamais permitir iludir-me, crendo serem originais.
Alguém me chama e então percebo que o tempo passou,
interrompo minha prática simbólica e volto-me para o aqui e agora não sem antes
registrar uma nova cena em minha máquina racional, pois se a cena não tem um
conteúdo original, pelo menos, possui um novo ângulo a ser considerado e, quem
sabe, poderei dar mais um passo em direção a um entendimento mais amplo do
despreparo que nós criaturas humanas ainda temos em relação à compreensão de
nossas posições e obrigações enquanto seres sociais.
Tudo é tão
aleatoriamente fugaz, menos a fome, a dor e o pouco caso.
Pense nisto em todas as vezes que um profissional, de
qualquer natureza pública, se achar no direito de não admitir ouvir criticas
acompanhadas de sugestões respeitosas. Lembre-o, então, sem medo de ser feliz,
que o contraditório é saudável e inerente a qualquer pessoa pública minimamente
inteligente e abastecida de intenções coletivas.
Um domingo de paz para você que está lendo a minha crônica e
que se permite também rebobinar seu próprio filme.
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