Pronto, um novo amanhecer silencioso, pelo menos aos débeis ouvidos humanos, já que na realidade, bem sei o quanto de ruídos ensurdecedores a vida com seus micro-organismos, imperceptíveis a não menos débil visão, fazem por todo o tempo.
Então, como o absoluto silêncio me convém, nem penso em colocar qualquer música, como de hábito, preferindo treinar minha velha audição cognitiva, afim de quem sabe, poder ouvir o apenas imaginado.
Todavia, como posso afirmar estar em silêncio total, se minha mente, mais parece a bateria da mangueira em pleno desfile carnavalesco?
Impossível, afinal, para não enlouquecer, precisei intuitivamente, ir identificando um a um dos meus instrumentos, digo, neurônios, afim de que, numa única e suportável harmonia, pudéssemos juntos permanecermos, desfilando o nosso original samba, pela avenida.
Fácil?
Pense no quanto, sem formação musical, precisei ser maestro para integrar surdos e tamborins, pandeiros e cuícas, barulhentas percussões, características do meu samba pessoal, com os incríveis e sempre necessários cavaquinhos com suas incríveis quatro cordas, corroborando para a manutenção da harmonia entre mim e minha natureza rebelde, sempre disposta a desfilar pela avenida a cada amanhecer com os pés descalços e, sem qualquer fantasia.
E aí, como tudo pouco é o meu muito, cá estou, teimosamente, comparando a profusão dos pássaros que já estão chegando, cada qual, com o seu som, ritmo e melodia, tendo como maestro a vida, como plateia, o tudo mais, incluindo eu, mas que neste instante, ao ouvi-los em grupos, adentrando ao jardim, imagino vaidosa, que desfilam, tocam e cantam só pra mim...
E assim, inspiro-me e insisto em não deixar o samba morrer, através dos meus anéis de bamba para quem quiser ler a cada amanhecer, ao som de meus pássaros e grilos, estribilhos constantes de meus insistentes repiques de vida e liberdade.
Regina Carvalho- 12.06.2024 Itaparica
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