Não sei se é
comum acontecer com as pessoas de um modo geral, mas comigo tem sido um
constante duplicar de sentimentos que assustam, libertando conceitos antigos
oriundos de uma formação sócio cultural que com o passar do tempo foi se
esfacelando e dando lugar a uma conscientização do claro e translúcido sentido
de quase tudo.
Penso que
seja bom este amadurecimento libertador, que rompe amarras que sempre
incomodaram, pelo menos a mim, mas que por uma certa espécie de conveniência ou
simplesmente hábito, faziam parte do que eu achava que era eu, e assim, segui
camuflando, numa hipocrisia de palavras e atitudes não conscientes, mas real
nas consequências.
Venho
descobrindo assustada que apesar de ter em minhas origens de avó paterna a
tenebrosa senzala de uma fazenda no então distrito de Valença, circunvizinha do
Rio de Janeiro, e de pregar discursos sobre os horrores do preconceito racial,
eu vivi décadas como uma preconceituosa disfarçada, ostentando uma brancura de
pele e renegando, silenciosamente, o negro presente no meu DNA.
Assusta a
conscientização, assim como dói arrancar da mente a certeza absoluta de que não
sou culpada e sim mais uma vítima, neste maldito desencontro social de classes,
onde a vaidade, mas acima de tudo a ganância contínua, transformou a pessoa de
pele branca num escravizador de vidas,
arrebanhando para si, além de baús de ouro, a herança sórdida, chamada
preconceito, que nada mais é que a perpetuação do ilógico, do insensato, eternizando a chaga do discriminador de tudo
que lhe é diferente, numa constante dor existencial.
Se para tudo
ser modificado, polido e lustrado nas posturas físico emocionais de uma pessoa
torna-se necessário advir de sua própria vontade mental, concluo nesta manhã de
14 de maio, cento e trinta anos depois da abolição fantasiosa da escravatura em
nosso país, que também somente através da lucidez individual seja possível,
lenta mais sustentável, a verdadeira libertação dos negros e dos brancos desta
contínua herança tenebrosa.
A verdadeira
libertação deverá acontecer quando o perdão for mais poderoso que o ódio.
Quando a consciência, tomar o lugar da indiferença.
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