Fala-se e ouve-se em meio à violência de todas as naturezas, assim como se fala em educação e ética, fala-se de corrupção com a naturalidade sistêmica, como se crime não fosse, fala-se da falta de comida, remédio, superfaturamento, licitações fraudulentas, pagamentos de propinas e etc. e tal.
Na verdade, fomos nos habituando a conviver com estes aspectos sórdidos em nossa política brasileira como se fossem práticas normais, impossíveis de serem combatidas e, assim, cada um de nós foi incorporando cada qual no seu grau de ambições pessoais ou de conformismo, o que ao nosso entender, já não tinha ou tem solução.
Por várias ocasiões fiz denúncias, recebi denúncias, lamentei as constatações, busquei solidariedade e, em todas, indubitavelmente, ou coloquei-me em risco de revanches criminosas ou permaneci solitária, não recebendo apoio nem dos denunciantes, ficando então a lamentar no vazio.
É preciso que encaremos a realidade de nossas posturas, focando o nosso grau de responsabilidade frente a estes e a outros tantos desmandos dos quais nos acomodamos, aceitando calados os jugos da prepotência e da mais cruel das violências, que é justo a velada, encoberta por tapinhas nas costas, sorrisos fáceis e discursos vazios, miséria nacional.
Penso, então, que somos todos tão ou mais culpados do que os políticos que elegemos, afinal, nós os colocamos onde estão com a força descomunal de nossos votos individuais e somos nós que os mantemos com a força sufocadora de nossa falta de ética pessoal em sequer respeitarmos os nossos direitos de cidadãos brasileiros (itaparicanos, goianos, pernambucanos, cearenses ou mineiros, etc.).
Não seríamos nós cúmplices efetivos e conscientes destes criminosos elegantes através de nossa omissão, covardia ou por termos ou estarmos de alguma forma levando alguma vantagem, seja na redução dos impostos municipais, fornecimento de algo para as prefeituras e câmaras, seja pelo emprego que conseguimos fora dos padrões de contratação oficial, seja pelo status de podermos nos dizer “amigos” de alguns deles, seja pela vaidade de nos tornarmos pessoas de destaque e poder ser fotografados aos seus lados como se eles fossem diferentes do ladrão que invade nossos negócios e residências, como os estupradores e pedófilos que adoramos condenar nas rodas que formamos nas esquinas e salões?
Não seriamos nós como eles, por os mantermos em suas mordomias tão hediondas quanto?
Mas se quisermos reduzir esta absurda e imensa quadrilha de abusivos criminosos às esferas administrativas, pensemos então em cada diretor, coordenador, nutricionista, psicólogo, assistente, merendeira e etc. que convivem calados com a vergonha em dispensar alunos por falta de merenda, sabendo que a verba está sendo desviada e além da sobra mal aplicada?
Como chamar classes de “profissionais”, pagos com o dinheiro público, que em uma absurda inversão de valores éticos, posturais e conseqüentemente decentes, se calam frente a todos estes desmandos de mandato em mandato e não se unem para dar um basta neste crime imperdoável?
Onde estão as procuradoras do estado, do município que, a priori, penso eu, na insignificância de meus entendimentos sociais, serem independentes em suas fiscalizações, exemplo de correção e ética?
Onde estão os juízes, desembargadores, etc.? Onde estão os mais letrados, formadores de opiniões, elites de cada cidade mergulhados nestes desmandos, hoje espelho da vergonha nacional?
Onde estão os empresários e candidatos a cargos políticos?
Onde estão os líderes comunitários, presidentes das associações?
Mas, acima de tudo, onde estão os Direitos Humanos, que correm a socorrer bandidos e deixam morrer de fraqueza e inanição, no físico e no caráter, toda uma geração ainda infantil?
Onde estão os paladinos da justiça social que se empenham tanto nisto e naquilo para se manterem em cadência e saciarem suas vaidades e não enxergam o crime dos crimes, que é justo permitir que a fome, a miséria, a omissão, roubo e pouco caso, mantenham reféns da miséria física e emocional aquele ou aqueles que moram a seu lado nos casebres e nas barracas, nas favelas ou comunidades, como de tempos pra cá tornou-se politicamente desigual.
Ética, princípio, primeiro e último que estrutura, mantém e impulsiona a vida de quem se intitula cidadão.
Cidadão?
Será que ainda existe? Ou foi substituído lenta e gradualmente por cartões assistencialistas, empreguinhos de merda, que fazem pais, tios e irmãos autoridades, e um povo em geral aplaudir vagabundos contumazes e ainda chamá-los de autoridades?
Onde estão os padres, pastores, líderes religiosos que não estruturam espiritualmente seus fiéis para, no mínimo, respeitarem a si mesmos, frente ao privilégio de terem sido escolhidos por Deus para estar vivenciando a grandeza da “vida”?
Somos todos seres políticos por natureza humana, já que precisamos, por inerência do cotidiano, a conviver uns com os outros, portanto, não nos cabe o papel subalterno da escravidão ou de nos sentirmos parte integrante de uma corrente infindável da vergonha de nossa nação.
Portanto, ou você, enfim, todos nós que nos calamos diante deste horror, somos vergonhosamente aliados, cúmplices e, acima de tudo, mantenedores de todas as mazelas que de uma forma ou de outra, mais dia, menos dia, bate ou baterá à nossa porta.
Na perda do respeito, nos resta a violência, pois nos últimos 30 anos, temos com fervor garantido nossos interesses pessoais e a certeza absoluta de que a cada futuro, alguém a quem amamos se perca ou perca a sua vida no tráfico ou em qualquer violência, fruto do desrespeito que mantemos com a omissão criminosa.
Antes de jogarem pedras, pensem nisto... e em tudo que seus olhos foram acostumados a não enxergar e suas almas se permitiram aceitar.
Ao invés de levarmos ao mundo as imagens paradisíacas dos mais lindos locais, assim como a graça, a beleza e a hospitalidade de seu povo, deixamos que levassem a vergonha e a tristeza de não sabermos gerir, cuidar e amar a nossa fantástica Ilha de Itaparica.
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