terça-feira, 20 de novembro de 2018

ANGU COM CAROÇO



Tem muito mais caroço neste angu que, nós pobres mortais brasileiros, possamos mensurar.
E esta deliciosa e nutriente fonte de alimentação que nossos ancestrais popularizaram, mas que os mineiros eternizaram ao complementar com o guisado de frango com quiabo, na realidade, nos porões governamentais de nosso “Brasil”, sempre foi o quitute preferido de nossos ilustres políticos, independentemente da região, do status corporativo ou seja lá do que fosse.
Todavia, como em todas as fartas refeições, as sobras são inevitáveis, jamais faltou bocas famintas para delas se fartarem e assim, de angu em angu, foram se esquecendo de bater devidamente os caroços, e aí, restou sempre para a galera, que somos nós, os senzalistas convictos das infinitas ignorâncias governamentais, os duros, secos e sem qualquer sabor caroços que, por muitos, devido à fome, ainda são chupados, mas para outros, tornaram-se abusivos e desnecessários, resultado do descaso de cozinheiros desatentos que há muito já deveriam ter sido despedidos.
É assim que vejo as vergonhosas ações públicas, pintadas de ouro falso como benécias sociais, quando na realidade deveriam ser, tão somente, ações corriqueiras de governos sérios em favor de um povo mais sério ainda.
A cultura da divisão entre qualquer diferença social, acirra a ideia de que qualquer ação pública é direcionada aos mais carentes, quando deveria ser projetada para o povo em geral com todas as especificidades de qualidade.
E aí, como pensam que para o carente tudo é lucro, oferece-se o medíocre e o pouco eficiente.
Duro o que estou afirmando ou apenas constatando a crueldade da maior expressão em relação ao tão combatido preconceito que, de tão sutil e vergonhosamente assimilado pelas pessoas, afinal, representam o povo, convive num cotidiano confuso e simbioticamente doente ou praticamos todos os tipos de preconceitos, por todo o tempo de nossas vidas sem sequer o percebermos, combatendo-o também na mesma proporção, em uma incoerência absurda.
Nos acostumamos a ouvir e a sentir o que o outro fala ou faz e nos esquecemos de prestar atenção ao que falamos e fazemos num verdadeiro angu de caroço.
O resultado destes caroços descartados e pelo povo digerido é exatamente as mazelas pelas quais guerreamos explicitamente a cada instante uns com os outros, numa violência de vômitos amargurados que ao longo da história brasileira, em várias ocasiões, lotou latrinas até mesmo daqueles que se julgam imunes a tudo.
Angu de qualidade precisa ser fino, sedoso e capaz de não interferir no sabor do frango e do quiabo, numa parceria completa que alimenta e não nos deixa esquecer do valor do cozinheiro.
E nesta iguaria dos Deuses, nenhum ingrediente se destaca, ficando o conjunto como uma inspiração que não deixa esquecer o quanto de bom somos capazes de criar e produzir.
- Senzalismo – ato de absorver e dar continuidade às práticas escravagistas.

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