quarta-feira, 14 de março de 2012

SENSACIONALISMO E SENSIBILIDADE


Quando ainda jovem, praticamente em início de carreira e de vivência, já havia percebido que as pessoas, de modo geral, adoravam um sensacionalismo, mesmo quando se diziam contra a este velho hábito jornalístico que perdurará enquanto existirem pessoas, mídia e vaidade.

Vaidade?

 Perguntarão alguns, afinal, a definição desta postura emocional, a princípio, não se coaduna, a não ser que esteja ligada à valorização ou exaltação da pessoa, refletindo-se naqueles que auferem rebarbas por estar junto ao destacado.

Quem não gosta de se sentir próximo de um astro famoso ou de qualquer pessoa que esteja sendo valorizada através de uma manchete jornalística, mesmo que pessoalmente, a criatura saiba muito bem que não é bem assim...

 Não é mesmo?

Todavia, outras circunstâncias podem despertar a vaidade, como por exemplo, o prazer de não estar em foco por se tratar de uma exposição que apresente aspectos negativos e, então, não ser manchete naquele momento ou nunca ter sido sob aquela circunstância, torna-se um consolo, envolto em vaidade que sublimado pela comoção que expressa, ou simplesmente crê sentir, o leva a ler até mesmo em detalhes às narrativas sanguinolentas dos redatores policiais que bem sabem como descrever o horror dos relacionamentos humanos ou das fatalidades onde a natureza mostra sua força destrutiva ou a criatura humana a sua vulnerabilidade ao destrutivo de qualquer natureza.

Entretanto, não para por aí, pois nós, criaturinhas em atraso evolutivo em se tratando de sentimentos, simplesmente adoramos conhecer nos mínimos detalhes todas as desgraças que somos capazes de deixar aflorar desta nossa natureza e do nosso aprendizado sistêmico, do qual somos os criadores, redatores, julgadores e finalmente punidores, dando-nos a vaidosa sensação de poder com o qual alimentamos outras infinitas manifestações emocionais.

Somos uma caixa enorme de contradições que, se bem dosadas, nos fazem parecer lindas criaturas, mas que ao contrário nos apresenta feios e desumanos  em um processo evolutivo  ainda lento.

Daí, acredito ter despertado em mim este prazer em direcionar meus leitores à curiosidade em torno dos assuntos onde um chamativo título cumpria o seu papel de envolvimento ou tão somente de informação, porque afinal, um título bem formulado, traduz uma notícia, produzindo no leitor preguiçoso a sensação de conhecimento que lhe permitirá em seu meio social, sentir-se informado e participante periférico de qualquer conversação a respeito.

E aí, escrevendo sobre os leitores de títulos, penso nos leitores das orelhas dos livros, decorando as sinopses, o nome do autor e seu histórico pessoal e até, acreditem, da editora que os produziu e galhardamente se mostram profundos eruditos nas rodas sociais.

Pensem um pouquinho e certamente vocês se lembrarão de alguém que é senhor em nos engabelar com a superfície de todo e qualquer conhecimento que exigiria dele e de qualquer outro uma dedicação maior, mas que pode causar uma grande impressão, levando-nos inclusive a invejá-lo, até que mais adiante, se formos pessoas atentas ou que tenhamos maior conteúdo sobre o assunto, venhamos a perceber o quanto o suposto erudito é falso.

Bem... Como o tudo o mais onde nós, criaturinhas sensíveis estejamos envolvidas, o simples, jamais se adequa, até porque somos diferentes em tudo por tudo, somente nos parecendo em se tratando da ação individualista que nos envolve, norteando mesmo que muito disfarçadamente nossas condutas.

E então, escrevendo sobre títulos, leitores e comportamentos humanos, relacionados com a mídia, lembro de um trágico acidente ocorrido em 1977 na Avenida do Contorno, já na Savassi, tradicional bairro de Belo horizonte, em que eu presenciei indo para o meu trabalho, duas freiras serem atropeladas e mortas às sete horas de uma manhã ensolarada, quando de costume, atravessavam  a larga avenida, depois de comprarem pães.

Ainda hoje, relembro com profundo incômodo todo aquele horror, mas ainda assim, insisto e volto a escrever, como fiz inúmeras outras vezes, porque com toda a certeza aquele acidente representou uma linha divisória em mim, onde a finitude, me ficou absolutamente clara, e a minha vulnerabilidade à flor da pele, não me permitindo esquecê-las e tão pouco banalizá-las, inclusive, me deixando absolutamente lúcida quanto à vaidade consoladora que me envolveu ao constatar que poderia ser eu  uma daquelas vítimas – pessoas -, porque, afinal, quantas e quantas vezes já atravessara aquela mesma avenida, naquele mesmo local.

E aí, agradecida e aliviada, mas não menos consternada com todo o horror que aquela cena provocara em mim, ao chegar ao Jornal no qual trabalhava, escrevi talvez a melhor crônica de minha vida, cujo título fiz questão que fosse: AQUI DEVERIAM NASCER FLORES!...

Perceberam a sutileza entre o espanto e a atração?




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