sexta-feira, 11 de julho de 2025

Quando a Fé Cala a Violência Grita

Cada amanhecer deveria ter sido, pelo menos nos últimos 35 anos, apenas mais uma manhã qualquer, no entanto, logo cedinho, basta abrir o noticiário, seja ele qual for, para ser golpeado por mais uma enxurrada de tragédias urbanas. Tiros à céu aberto, assaltos e roubos a cada instante, crianças baleadas em becos que já foram quintais. 

As cidades sangram todos os dias...


O que me espanta, talvez mais do que a violência em si, é o silêncio das vozes que outrora ecoavam mensagens de amor, paz e fraternidade. Onde estão, as religiões que antes preenchiam os corações com esperança e os espaços públicos com valores agregativos e éticos? Teriam sido derrotadas? Ou foram apenas engolidas por um mundo cada vez mais acelerado, imediatista, onde o Divino foi substituído pelo consumo, pelo poder, pela pressa em eleger um político como intermediário junto aos poderes, assim como, se transformarem em celebridades, no tocante à vida artística, num desvio de funções, que certamente atraem seguidores, mas não fieis, numa descaracterização da prática do poder da oração e da reflexão?

Mas não é só a pratica da fé que parece ter recuado. A família, este núcleo essencial de formação afetiva e moral, também tem enfrentado sua própria derrocada. Lares fragmentados, pais ausentes em sua esmagadora maioria, reféns da sobrevivência e aí, jovens sem referências afetivas e estruturais, tornam-se presa fáceis para o apelo sedutor da violência. Quando falta o exemplo dentro de casa, o mundo lá fora impõe o seu.

A educação, por sua vez, que deveria ser o alicerce dos exercícios de convivência e transformação, também cambaleia. Proliferam escolas e universidades como se fossem meros negócios e garantias de votos, multiplicando-se diplomas, mas esvaziando-se os conteúdos. Muitos alunos entram e saem dos sistemas de ensino sem nunca terem sido verdadeiramente tocados pela reflexão, pela ética, pela consciência crítica. Uma educação rasa produz cidadãos frágeis, que por sua vez, fragilizam os sistemas, alimentando a mediocridade.

A verdade é que a violência urbana não nasceu do nada. Ela germinou em solo fértil: desigualdade social, abandono estatal, famílias em ruínas, escolas frágeis e fé institucionalizada, distante da realidade. É nesse vácuo que o crime se instala, oferecendo pertencimento, lucro fácil e até mesmo uma distorcida forma de respeito, onde a banalidade transforma os absurdos em progresso e direitos.

Dói pensar que não precisa ser assim...

A fé pode e deve sair dos púlpitos e das páginas dos livros sagrados para caminhar ao lado de quem sofre. Precisa se reinventar, se fazer presente, encarnada no concreto da vida urbana. A religião que se cala e se torna mais um tipo de comercio, transferindo para Deus e o Diabo, a responsabilidade individual, torna-se cumplice silencioso da violência.

Não é uma questão apenas de rezar em dias pontuais, é preciso agir. Reerguer pontes onde só há disfarçados muros, fortalecer famílias onde só há ausências, reconstruir escolas onde só há estruturas. Porque enquanto as religiões se omitirem e os conluios junto aos poderes e as vaidades persistirem, a violência continuará a gritar.

Afinal, nunca tivemos tantas Igrejas e Templos, assim como  famílias destroçadas pelas perdas cotidianas e nunca estivemos tão expostos e amedrontados.

Então, o que de sã consciência, podemos dizer que; “tudo está bem e melhor que dantes”, se perdemos a liberdade e a alegria saudável de viver?

Regina Carvalho- 11.07.2025 Itaparica

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