O domingo está amanhecendo, e posso de onde estou sentir o friozinho safado que vem lá de fora, teimoso e insistente, querendo fazer com que eu pense que já é inverno, numa tentativa quase infantil de confundir-me.
Qual nada, bem sei que estamos no outono e que este frio é
só um lembrete de que ele chegará como sempre chuvoso, mas na maior parte do
tempo, morno pra quase quente, pois afinal, aqui é a Bahia, onde o sol é bem
mais presente.
Enquanto o meu corpo e meus sentidos se entrosam com a
temperatura externa, minha mente voa como sempre faz nos amanheceres de minha
vida.
Tanto quanto posso me recordar, foi assim sem tirar nem por,
porque, afinal, acordar bem cedinho, antes de o sol raiar, só para me antecipar
às maravilhas do amanhecer, foi sem dúvidas minha prioridade, minha rotina, meu
prazer.
Descobri, ainda muito jovem, o quanto neste horário minha mente
especulativa era capaz de produzir, através das viagens criativas de meu
emocional que, absolutamente curioso e passional, sempre esteve disposto a
percorrer os caminhos dos comportamentos humanos, em buscas e encontros,
surpreendentemente reveladores.
Ao longo do tempo, também fui compreendendo que por uma questão
de lógica, pois a vida em toda a sua complexidade é pura lógica, que a produção
aparentemente virtual de minha mente, era tão somente uma pequena, mas
significante vibração em parceria com outras e outras vibrações humanas ou não,
em um ciclo de interação universal sem fim, fazendo de mim um ser participativo
e, absolutamente atuante neste contexto de vida e liberdade, onde o gerente é a
rotatividade cósmica e eu apenas um fragmento existencial.
Enquanto escrevo, tudo lá fora se transforma. Percebo que já
não chove como dantes e os pássaros ariscos cantam mais próximos das árvores e
de mim, numa orquestração deslumbrante que chama a minha atenção, fazendo de
mim, com certeza, a criatura mais feliz deste universo, pois me sinto viva,
bonita e amada, me sinto gente, fragmento abençoado.
Que neste domingo, meio chuvoso e meio frio, sua mente possa
voar, buscando sua própria essência, num encontro alegre entre você e a certeza
da importância da sua existência neste contexto às vezes complicado e
aparentemente frustrante de existir.