São cinco
horas da manhã e os trovões trazem consigo uma grossa e caudalosa chuva, e
ambas barulhentas ao ponto de assustarem os meus cachorrinhos que preferiram
abrigar-se junto aos meus pés por sob a mesa.
Sempre que isto
acontece, penso na minha infância tão rica e abastecida de parâmetros com os
quais me vali a vida inteira justo para exercitar a mente nas avaliações de
lógicas pessoais e um deles foi a correlação entre os trovões e Deus, pois
afirmava minha singela mãe que quando trovejava e o céu se riscava de luzes
incandescentes era porque Deus, irado, levantava o seu cajado e nos punia,
causando medo e muitos estragos.
Pensava eu
com os meus botões:
- Se Deus
era puro amor, como poderia sentir ira por sua própria e exclusiva criação?
Bem o tempo
foi passando e já quase adolescente em um carnaval que a família, como sempre
ocorria, decidiu ir para a casa de campo em Guapimirim (RJ), fomos
surpreendidos com uma tempestade jamais vista por qualquer um de nós e eu,
naturalmente curiosa e apaixonada por aquele lugar fascinante que abrigava o
meu riacho particular, minhas piabas e minhas brisas, não poderia sob nenhum
pretexto perder tão poderoso espetáculo, e por dois longos e impressionantes
dias optei pela vasta varanda que passou a ser a galeria de minhas descobertas,
abrigo de minhas indagações.
Deixei sem
qualquer real consciência a mente fluir, traçando situações inusitadas, usando
o barulho confuso e agitado das águas do riacho que arrastavam consigo tudo que
ia encontrando pelo caminho e misturando seus sons com a poderosa chuva que
malhava o gramado, arrancando tufos verdejantes, fazendo saltar a terra que se
abrigava nela.
Foram dois
dias de inusitadas sensações, mas que confesso que em muitos momentos me senti
fascinada, fazendo brotar em mim sensações de arrepios e muito prazer,
principalmente, quando arisca, chegava mais próxima das goteiras que escorriam
como cascatas do telhado e podia sentir os respingos em minhas pernas que
traziam com eles todo o frescor das chuvas de verão.
Creio que
deixei de sentir qualquer temor por Deus no exato momento em que senti o
primeiro arrepio de prazer que os respingos benditos tocaram em mim, e pensei
tempos depois que os transformei em meus parceiros de muitos sorrisos e
alegria, quando nas praias ou na volta da escola era surpreendida por uma
rápida chuva, levando-me a instintivamente abrir os braços para recebe-la,
jogando assim por terra a ideia enganosa de que a chuva nada mais era que a ira
deste mesmo Deus que também minha mãe sempre dizia ser o criador da vida, a
mesma vida que eu reconhecia em mim e que eu adorava.
Esta
aparente simples conclusão foi conseguida após as chuvas, quando o céu
brilhante se abriu em um sol esplendoroso, fazendo explodir do solo antes
machucado, o florido de nossas vegetações, secando os telhados, perfumando a
terra e fazendo brotar em minhas margens acolhedoras de minha infância e
ingenuidade, as samambaias gigantes de meu despertar pra vida.
BOM DIA!!!!
Com um beijinho doce nos seus corações.
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