quarta-feira, 27 de junho de 2012

AO SOM DO CROQUE, CROQUE...



Mastigo umas nozes e o som do croque, croque, me remete à infância, aos natais na casa de minha avó paterna. Fecho os olhos e sou capaz de reviver a cena, tantas vezes repetida, cujo cenário rico me encantava nos detalhes elaborados com extremo carinho pelas mulheres da família.

A elegante e grande mesa, posta no centro da sala, forrada com toalha branca engomada e bordada, fartamente adornada com finas iguarias, que meus olhinhos de criança desejavam, fazendo parecer que o tempo para devorá-las, não chegava nunca.

Fecho então os olhos eternizando a memória, revendo instantes fascinantes que de tão poderosos e resistentes, me levam a um quase delírio de prazeres, através do simples ato de mastigar pequenas nozes.

Croque, croque, e então, posso enxergar a fumaça subindo e se perdendo pelo caminho de encontro ao nada do espaço das paredes brancas da cozinha, onde minha mãe, com uma enorme colher de pau, continha os siris que desesperados, tentavam escapulir, fincando suas garras nas bordas da gigantesca panela.

Aquele duelo de titãs ao mesmo tempo em que me fascinava, despertava em mim, uma pena enorme daqueles bichinhos, o que me rendia um bota fora constante da cozinha, pois segundo minha avó, eles demoravam a dormir por causa de meus lamentos a expressar por todo o tempo:

- Coitadinhos, minha mãe!

- Coitadinhos, minha avó!

Já lá fora no terreiro, amarrado a uma só perna e girando como um pião, havia sempre um peru, fazendo constantes glu, glus, que me causavam apreensão, pois achava o seu pescoço enrugado e muito feio, parecendo-me coisa talvez de um pequeno monstro, que eu já vira em algum gibi da coleção de meu irmão

Voltava então para cozinha, para sala ou para o outro lado do terreiro de  onde podia através da enorme porta de vidro, admirar a verde e fresca árvore de natal, repleta de enfeites e luzes que piscavam por todo o tempo e que de tão alta encostava  no teto do hall de acesso a sala principal, onde criança não entrava até na hora do Natal, servindo como mistério que aguçou minha imaginação, fazendo-me, através de meus olhinhos fascinados, elaborar histórias de príncipes e princesas que mais tarde inspiraram-me  a perseguir a beleza que fatalmente existia em todos e em tudo com que convivia, tornando a vida um pouco mais colorida e repleta de lembranças, até mesmo ao som do croque, croque, das nozes que mastigo.

Croque, croque, sons de lembranças de uma infância completa, de natais agregadores, onde o meu presente de Papai Noel era estar por todo o tempo entre meus pais, avós e tias, aromas e sabores, aprendendo a identificar instantes de pura felicidade, até mesmo quando apenas lembrando, como faço agora, ao som do meu mastigar de nozes.



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