domingo, 2 de agosto de 2015

ATENDIMENTO DE QUINTA


Após dias muito chuvosos, o domingo amanheceu radiante, trazendo a luz translúcida do sol do inverno, aquecendo e estimulando e, no embalo desta surpreendente manhã, fui para a cozinha, entusiasmada à preparar um almoço especial para a família, colocando na preparação, todo o meu empenho e amor, o mesmo que por toda a minha vida coloquei nas minhas escritas e em tudo que procuro realizar, não que eu seja especial, nisto ou naquilo, mas tão somente, consciente de que através do que faço, seja lá o que for, certamente, estarei colocando o meu perfil de pessoa humana.
Embalada nesta reflexão enquanto refogo um arroz no alho e óleo, penso nas infindáveis reclamações que recebo através de meu trabalho à frente da Rádio e do Jornal, em relação aos abusos que elas são alvos nos hospitais e postos de saúde da região, e penso então, que é surreal o quanto os mesmos estão despreparados humanisticamente para o atendimento, principalmente em relação as pessoas mais simples e humildes, no tocante aos seus poderes socioeconômicos.
Como encontrar algum sentido na indiferença reinante, desde o recepcionista ao médico de plantão, com raras exceções, que fere mais profundamente que a ferida exposta da maioria que adentra nestes locais, no mínimo, buscando encontrar um pouco de acolhimento?
Penso, repenso, enquanto passo a colher revirando o arroz, tendo o cuidado de soltá-lo do fundo da panela para que não queime, no quanto seria maravilhoso, se cada criatura sofrida ao chegar nestes locais, pudesse encontrar, tão somente, um sorriso, um oferecimento afetuoso, que apenas custa um singelo interesse, remédio potência à maioria das chagas humanas.
Recepcionistas alienados, médico que não os encara em suas dores e fraturas, enfermeiras secas e apressadas, paredes frias que se confundem com a atmosfera de enfado, cansaço e desilusão de se ter nascido pobre, numa região pobre, na maioria das vezes ainda negro e com poucos conhecimentos quanto aos seus direitos, sufocado pela certeza de não significar quase nada, menos até, que a dor que o levou a mais aquele calvário.
Penso então, enquanto desligo o fogo deste arroz fresquinho e cheiroso, que, infelizmente, a culpa sempre é do paciente, que teimoso e chato, ficou doente e insiste em receber atenção pelas suas chagas.
Que coisa,
 hein!!!!




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