quarta-feira, 2 de outubro de 2013

FORASTEIRA, SIM SENHOR...


Ainda me lembro, parece-me que foi ontem e lá se vão quase 12 anos em que entusiasmada com a beleza da cor do mar, associada à translucidez do sol, adentrei nesta cidade, para não mais dela conseguir me distanciar.
E ir embora, por quê?
Afinal, tenho tudo que sempre procurei em todas as paragens que visitei, em todos os redutos em que me aninhei.
Ir embora pra que?
Se o tudo de bom, foi por aqui que encontrei e o que eu trouxe comigo por aqui se estabeleceu.
Abracei os aromas, os sabores, as energias, abracei o mar, o sol e as pessoas e em momento algum tentei modificá-las, com a arrogância natural dos que chegam de fora.
 Como a maioria, cheguei esbaforida, trazendo na bagagem mil ideias, mil vivências, esbarrei no atavismo, no desconhecido, no diferente, tropecei na desconfiança, no medo dos que por aqui sempre estiveram.
Mas como também cheguei fraca, doída e machucada, deixei-me conduzir e ser tratada descansando a mente, equilibrando o coração, deixando entrar a paz do bendito diferente.
E hoje, recordando um pouco de tudo, sou obrigada a reconhecer que o diferente era eu, que, sem pedir licença, fui me chegando, ocupando espaço, sem sequer perguntar  se havia lugar na seara alheia, e como intrusa absolutamente encantada, sequer pensei o que poderiam os donos da casa, estarem aborrecidos com esta minha chegada, assim tão repentina, tão sem cerimônia.
Que coisa absurda, hein?!
Imaginem vocês, se mais incoerente e insensível fosse minha forma de ser, se ainda por cima eu quisesse na rotina deles, inserir os conceitos e hábitos dos quais, eu mesma, estava tentando fugir, mesmo que inconscientemente.
Pensando bem, cá entre os meus botões, que diabo é essa necessidade cruel que nos induz em quase todos os nossos instantes à tentar modificar o que nos cerca, acreditando ferrenhamente, que somos os  sabedores do ideal alheio.
E aí, nos ofendemos quando alguém, mais ousado, nos lembra  sem piedade que somos de fora, ilustres forasteiros, e aí, bem, ofendemo-nos, irritamo-nos,  magoamo-nos, no entanto, somos obrigados a admitir, nem que seja tão somente à nós mesmos, que fomos invasivos, arrogantes e presunçosos em  crer, mesmo que por um único instante, que sabemos mais o que lhes convém.
O melhor que fazemos é aceitar o que nos encantou, abraçando o tudo de bom, partilhando das delícias, sempre prontos a oferecer o nosso melhor, sempre na medida  em que nos pedirem, na proporção que nos cabe, não esquecendo jamais que foi exatamente este diferente que nos atraiu.
Sou de fora, sim senhor, mas vivo bem juntinho com os de dentro, chegando às vezes até mesmo a me esquecer de que não sou daqui, que sou de lá, de um lugar que já não me servia mais e que encontrei pelas bandas de cá, o não encontrado nas bandas de lá, que foi justo, meu pedaço de chão, meu sentido maior de pertencimento.  
Mudar as coisas e as pessoas, então, pra quê, se exatamente o que me encantou, foi este tudo aparentemente errado, que encontrei.


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