...era a tônica das avaliações em 1966 de alguns preconceituosos em relação a um mineirinho do interior, prometido desde a adolescência para a filha de um próspero fazendeiro, surpreendentemente vir namorar e ainda mais, querer casar com uma cosmopolita carioca do quadrilátero de ruas e avenidas do que existia e ainda existe de mais sofisticado em uma Ipanema (RJ), referência de uma perigosa mescla de liberdade, beleza e refinadíssima elegância de modos e costumes, reduto de personagens icônicos de autoridades a poetas.
Pois é, mas deu, até porquê, a carioca em questão, era o avesso do avesso de tudo que esperavam dela, já que com alma de passarinho, buscava com 16 aninhos de puríssima espontaneidade um apenas ninho que a aconchegasse e aí, deu no que deu, apaixonei-me loucamente pelo filhote de borboleta (apelido dado pelo meu irmão, por este, ser miúdo, enquanto, eu já ostentava um mulherão).
Aos gritos e segurando uma dúzia de ovos de primeira postura, como se fosse uma barra de ouro, irrompi porta adentro do apartamento; mamãe, mamãe, conheci o meu futuro marido e ele me deu esses ovos, depois que me levou para conhecer a granja de seu tio.
É mesmo!!! E ele já sabe disso? (rindo), pois era uma gozadora e bem familiarizada com os meus rompantes e peculiaridades, bem aos moldes de meu irreverente pai.
É claro que não, mas pode escrever... Eu me casarei com ele.
E não foi que acertei em cheio, afinal, em três meses me pediu, em seis meses noivamos e no total de um ano e dois meses, nos casamos.
Trem bom da conta, sô...
Pois é, o tempo foi passando e o safado, sem aviso prévio partiu em 2020 antes de mim, fugindo ao sempre combinado em jamais me deixar sozinha.
Hoje, estaríamos completando 58 anos deste primeiro apaixonado encontro, onde tudo dali em diante, como previsto, se atrapalhou, quase parecendo errado, menos a nossa ardente paixão, num misto sempre renovado de irmandade e tesão, tropeços e perdões, não só de um para com o outro, mas também pela compreensão sobre liberdade em se curtir a vida, repletos de medos, mas sem a covardia da inércia.
Nossa irmandade, em tudo passava o pano quente do bendito amparo amoroso, certos da sempre certeza de que, errando ou acertando, havíamos sido feitos um para o outro e que, não daríamos certo com mais ninguém.
Foi deliciosamente eterno, enquanto de mãos dadas, tiros, porradas e bombas, durou...
Regina Carvalho- 31.10.2024 Itaparica
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Foto tirada em 2008 em nosso reduto de absoluta paz.