terça-feira, 29 de outubro de 2024

NEM MESMO A MORTE...

Chopin ressoa na sala e até, posso ver através da mente, as teclas do piano alternando-se ao comando do sensível pianista, induzindo-me a fechar os olhos, mas não posso, preciso registrar o momento único deste final de tarde silenciosa, já que os pássaros se recolheram e os grilos, talvez, pelo magistral som que atravessa as persianas das janelas, também a eles parece encantar, silenciando-os como forma de respeito.

Pauso por uns instantes, deixando virem a mente, lindas lembranças de minha juventude, tendo em meus braços meu filho Luiz Claudio...Quanta ternura, quanto encantamento...


Fleches se sucedem e assim como as notas musicais, alternam-se em instantes absolutamente sublimes, onde ele e eu, nos completávamos e saciávamos a nossa sede de amor incondicional...

Sem leite, aconchegava-o em meu regato e cuidadosamente, fazia deslizar pelo meu seio, o leite derramado cuidadosamente, oriundo de uma pequena mamadeira, fazendo de meu peito, o teu alimento, fazendo de mim, apenas tua mãe.

Inseparáveis, não importando aonde estejas, atravessei contigo a minha vida, entrelaçada com as fitas amorosas de seda do universo.

Juntos, quinze anos depois, este mesmo universo, desejoso em novamente me presentear com novas fitas coloridas, envia-me a nossa Anna Paula, com quem repeti o ritual da bendita amamentação, revivendo em cada sugada em meu peito, as delícias de um novo recomeço, reforçando em mim, a certeza de uma vida plena, absolutamente fora do convencional, robustamente abastecida de amor...

A noite, agora dominante me acompanha assim, como Chopin neste reviver das memórias, induzindo-me a deixar rolar por sobre minhas faces, lágrimas puríssimas de alegria e gratidão ao universo por suas fitas de sedas coloridas, cada qual, a seu tempo e com as suas especificidades, embalaram a caixa de um grande amor indestrutível, que de tão poderoso, mantém-me sorridente, mesmo estando, aparentemente só.

Às vezes como agora, sinto a casa cheia dos meus amores, a grande mesa farta e a certeza absoluta de que, verdadeiramente, nasci para ser a criatura mais abençoada desta vida.

Não houve um só instante que eu consiga me lembrar, em que o medo, as decepções, as frustrações, as perdas e as dores, fossem mais fortes que a resistente caixa, amarrada com as fitas de sedas coloridas do universo, nem mesmo a morte, desatou, deixando escapar seu bendito conteúdo. 

Chopin, continua ressoando na sala e no meu coração...

Regina Carvalho- 28.10.2024 Itaparica

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